Entenda por que infecções de imunizados não representam falha nas vacinas

Casos de Covid-19 em pessoas vacinadas podem acontecer, uma vez que os imunizantes foram projetados para prevenir a doença grave, hospitalizações e mortes

Na maioria dos casos, um “disruptivo” significa uma descoberta repentina, dramática ou importante. Com a Covid-19, no entanto, a expressão foi usada para descrever uma infecção que “quebrou” a imunidade protetora da vacina – e isso às vezes é mal interpretado como um sinal de que a vacina não está funcionando.

Para a comunidade de saúde pública e os cientistas que ajudaram a criar as vacinas, no entanto, “infecção disruptiva” significa exatamente o oposto: a prova de que a vacina está fazendo seu trabalho, exatamente como deveria.

É confuso: como as vacinas realmente funcionam, e o que significa se alguém ainda fica infectado depois de ser vacinado?

Primeiro, vamos dar uma olhada nos dados dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, que foram analisados pela equipe de saúde da CNN internacional. Mais de 164 milhões de pessoas nos Estados Unidos foram totalmente vacinadas contra a Covid-19 no início de agosto.

A análise dos dados da agência mostrou que menos de 0,001% desses indivíduos – 1.507 pessoas – morreram e menos de 0,005% – 7.101 pessoas – foram relatadas ao CDC como tendo sido hospitalizadas com Covid-19.

O envio dos dados ao CDC não é obrigatório, mas 49 estados americanos contribuem para esses valores totais, o que significa que o CDC vê esses números como um retrato instantâneo útil de como a vacinação está funcionando bem. Os dados sugerem que mais de 99,99% das pessoas totalmente vacinadas não tiveram um caso disruptivo de Covid-19, resultando em hospitalização ou morte.

Alguns desses dados são de uma época anterior à disseminação da variante Delta pelo país, que provocou um aumento das taxas de infecção. No entanto, uma pesquisa da Kaiser Family Foundation divulgada em julho apontou que, dos mais de 18 estados que relataram dados, em pelo menos 95 em cada 100 hospitalizações e mortes ocorreram em pessoas não vacinadas ou não totalmente vacinadas.

Ao mesmo tempo, porém, muitos de nós conhecemos alguém que, após ter sido totalmente vacinado, apresentou resultado positivo para o coronavírus e sintomas. Eu conheço vários casos também. Talvez seja o professor do seu filho, seu cunhado, seu vizinho, seu colega de trabalho ou seu mecânico.

E embora seja uma ótima notícia podermos deixar canja de galinha em suas portas em vez de ir aos seus funeráis, isso faz os fenômenos parecerem muito reais e nada “raros” – então provavelmente deveríamos parar de descrevê-los dessa forma. Na verdade, como os indivíduos vacinados não são testados com frequência, não temos ideia de quão comuns essas infecções realmente são.

Toda a situação realmente me fez pensar sobre o termo “infecções disruptivas” e se é mesmo a sentença certa. Para mim, não parece claro o suficiente para descrever o que está acontecendo. Serve apenas para alarmar aqueles de nós que já estão vacinados e potencialmente desencorajar aqueles que estão hesitantes.

Em busca de um termo melhor
Logo descobri que existem outros cientistas que também não gostam da frase “infecção disruptiva”.

“Eu odeio, porque enfatiza algo que muitas [outras] vacinas, nós sabemos, fazem”, disse Carlos Del Rio, professor de medicina da Divisão de Doenças Infecciosas da Escola de Medicina da Emory University. “Não falamos sobre os casos de gripe e dizemos que temos infecções ‘disruptivas’, falamos sobre a eficácia. […] Acho que disruptivo se tornou um termo que é igualado à falta de eficácia”.

Del Rio observou que as vacinas foram projetadas especificamente para proteger contra a doença grave e morte, e é isso que esses grandes testes de vacinas buscaram. “A infecção nunca foi um ponto final nesses estudos”, disse ele. A descoberta posterior que as vacinas podem prevenir a infecção, “era um pouco … como a cereja do bolo”, disse.

A frase também incomoda o imunologista e virologista Barney Graham, vice-diretor do Centro de Pesquisa de Vacinas do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, cujo laboratório desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento da vacina da Moderna.

Graham descreveu de uma forma que realmente me fez visualizar o efeito da vacina no organismo. “As vacinas sempre foram projetadas para se concentrar contra doenças nas vias aéreas inferiores [os pulmões] – não nas vias aéreas superiores [no nariz e na garganta]”, explicou ele.

Pense sobre isso. De acordo com Graham, uma pessoa fica gravemente doente quando o vírus entra nos pulmões, e é exatamente aí que as vacinas oferecem sua barreira mais protetora. Veja, as vacinas desencadeiam a criação de imunoglobulinas, que são proteínas que funcionam como anticorpos.

A principal gerada pelas vacinas é a imunoglobulina G (IgG), que passa facilmente do sangue para as vias respiratórias inferiores (pulmões), onde pode bloquear o vírus. O nível de IgG no sangue necessário para penetrar nos tecidos das vias respiratórias superiores (nariz e garganta) é muito mais alto, e é por isso que é mais difícil bloquear o vírus no nariz.

“É por isso que vemos tanta consistência na eficácia contra a doença grave. Elas não foram projetadas para proteger tanto as vias aéreas superiores”, explicou. É também por isso que Graham disse que os cientistas não esperavam que as vacinas prevenissem tanto a infecção. “Tivemos muita sorte que sim, até certo ponto, contra cepas anteriores”, acrescentou.

E, embora a variante Delta seja mais transmissível, o que significa que certamente ocorrerão mais infecções em geral tanto em vacinados como em não vacinados, haverá uma diferença maior entre os dois grupos no que diz respeito à proteção contra doenças graves em comparação com a proteção contra doenças leves ou assintomáticas, de acordo com Graham.

Isso fica claro a partir de dados que mostram que a grande maioria das hospitalizações e mortes acontecem em pessoas que não receberam os imunizantes, não em vacinadas.

Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2021/08/18/entenda-por-que-infeccoes-de-imunizados-nao-representam-falha-nas-vacinas

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